Casa MAIS Sem Categoria Força Policial: 7 Novas Diretrizes

Força Policial: 7 Novas Diretrizes

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Força Policial: 7 Novas Diretrizes
O governador do Estado de São Paulo, Márcio França, participa da cerimônia de formatura de novos sargentos para a Polícia Militar do Estado de São Paulo. Local: São Paulo/SP Data: 17/08/2018 Foto: Governo do Estado de São Paulo
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Decreto federal nº 11.984 busca aprimorar a atuação das forças de segurança pública com foco em direitos humanos e eficiência

O Governo Federal deu um passo significativo para reformular as práticas policiais no Brasil. Foi publicado no Diário Oficial da União, em 11 de abril de 2024, o Decreto nº 11.984, que estabelece diretrizes nacionais sobre o uso da força pelos agentes de segurança pública em todo o país. A medida visa aprimorar os procedimentos operacionais, promover maior controle da atividade policial e, principalmente, reforçar a proteção dos direitos humanos. O Portal RJ News analisou o documento e traz, em primeira mão, os detalhes e as implicações dessas novas regras que prometem impactar diretamente o cotidiano das forças de segurança e da população brasileira.

Contexto: Uma Resposta a Demandas Sociais

A publicação deste decreto surge como uma resposta a uma crescente demanda da sociedade civil por maior transparência e responsabilização na atuação das forças policiais. Nos últimos anos, diversos casos de uso excessivo da força ganharam repercussão nacional e internacional, gerando debates acalorados sobre a necessidade de reformular as práticas policiais no Brasil. Manchetes em portais de notícias, como “Jovem negro é morto em ação policial na periferia” ou “Polícia é acusada de truculência em protesto”, tornaram-se frequentes, alimentando a percepção de que algo precisava ser feito.

Organizações de direitos humanos, tanto nacionais quanto internacionais, têm pressionado por mudanças. Relatórios apontam para a alta letalidade policial no Brasil, especialmente em comunidades pobres e entre a população negra. A cobrança por uma atuação mais pautada pelos princípios da legalidade, necessidade, proporcionalidade e conveniência se intensificou, culminando na elaboração e publicação do Decreto nº 11.984/2024 que agora analisamos.

O Decreto em Detalhes: Uma Análise Aprofundada

O Decreto nº 11.984, de 11 de abril de 2024, estabelece uma série de princípios e diretrizes que devem nortear o uso da força pelos agentes de segurança pública. A ideia central é que o uso da força seja sempre o último recurso, utilizado somente quando estritamente necessário e de forma proporcional à ameaça enfrentada. Vamos aprofundar cada um dos principais pontos:

1. Princípios Fundamentais:

  • Legalidade: Toda ação policial deve estar rigorosamente amparada pela lei. Isso significa que os agentes só podem agir dentro dos limites estabelecidos pela legislação vigente, respeitando os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal.
  • Necessidade: O uso da força só é justificado quando for o único meio para atingir um objetivo legítimo, como conter uma agressão ou impedir uma fuga. Outros meios menos lesivos devem ser priorizados sempre que possível.
  • Proporcionalidade: A intensidade da força empregada deve ser compatível com a gravidade da ameaça ou do crime que se busca prevenir ou reprimir. O uso de força letal, por exemplo, só é admitido em casos de risco iminente de morte ou lesão grave.
  • Moderação: Mesmo em situações que demandam o uso da força, os agentes devem buscar minimizar os danos e as lesões, agindo com moderação e bom senso.
  • Conveniência: Os agentes devem avaliar o contexto e as circunstâncias antes de decidir pelo uso da força, considerando os riscos envolvidos e as possíveis consequências de sua ação.
  • Responsabilização: O decreto enfatiza a importância da responsabilização dos agentes por qualquer uso excessivo ou ilegal da força. Mecanismos de controle interno e externo devem ser fortalecidos para garantir que os abusos sejam investigados e punidos.

2. Uso Diferenciado da Força:

O decreto reconhece a necessidade de um “uso diferenciado da força”, ou seja, um uso proporcional e adequado a cada situação específica. Isso implica considerar fatores como a idade, o gênero, a condição física e mental da pessoa abordada, bem como o contexto da ocorrência. Por exemplo, o uso da força contra crianças, adolescentes, idosos ou pessoas com deficiência deve ser evitado ao máximo, e, quando necessário, deve ser feito com extremo cuidado e moderação.

3. Instrumentos de Menor Potencial Ofensivo:

O decreto incentiva a adoção e o uso prioritário de instrumentos de menor potencial ofensivo, como sprays de pimenta, armas de choque e munições não letais. A ideia é reduzir a letalidade das ações policiais e minimizar o risco de ferimentos graves ou mortes. A utilização desses instrumentos, no entanto, também deve seguir os princípios da necessidade e proporcionalidade.

4. Vedação de Determinadas Condutas:

O decreto veda expressamente algumas condutas, como:

  • Disparos de advertência: Essa prática é proibida devido ao alto risco de acidentes e à sua ineficácia como medida intimidatória.
  • Disparos contra veículos em fuga: Atirar em veículos em movimento só é permitido em situações excepcionais, quando o veículo estiver sendo utilizado para causar morte ou lesão grave iminente, e desde que não coloque em risco a vida de terceiros.
  • Ações sob forte emoção ou provocação: Os agentes devem manter o controle emocional e agir com profissionalismo, mesmo diante de situações de estresse ou provocações.

5. Socorro Imediato: Garantia de Assistência e Dever de Cuidado

O Decreto nº 11.984/2024 estabelece, de forma inequívoca, a obrigatoriedade do socorro imediato a qualquer pessoa ferida em decorrência de ações envolvendo agentes de segurança pública. Este ponto é crucial para a proteção da vida e da integridade física dos cidadãos, reforçando o compromisso com a preservação da dignidade humana mesmo em situações de conflito ou uso da força. Mais do que uma simples formalidade, a garantia de socorro imediato representa um dever ético e legal, impondo aos agentes do Estado a responsabilidade de agir prontamente para minimizar as consequências de suas ações e assegurar a assistência necessária às vítimas.

O decreto determina que, em caso de ferimento decorrente de intervenção policial, os agentes envolvidos devem garantir o socorro imediato à pessoa atingida. Essa obrigação se desdobra em duas vertentes principais:

  • Adoção de Medidas de Primeiros Socorros: Os agentes de segurança pública devem estar aptos a prestar os primeiros socorros básicos, realizando procedimentos emergenciais que podem ser vitais para a preservação da vida até a chegada de atendimento médico especializado. Isso inclui ações como conter hemorragias, desobstruir vias aéreas, realizar massagem cardíaca, entre outras técnicas de suporte básico à vida. A capacitação dos policiais em primeiros socorros é, portanto, fundamental para a efetiva implementação dessa diretriz. Os treinamentos devem ser periódicos e atualizados, abrangendo as principais situações de emergência que podem ser encontradas em ocorrências policiais.
  • Acionamento Imediato de Equipes Médicas Especializadas: Simultaneamente à prestação dos primeiros socorros, os agentes devem acionar, sem demora, equipes médicas especializadas para o atendimento da vítima. Isso envolve a comunicação rápida e eficiente com os serviços de emergência, como o SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), fornecendo informações precisas sobre a localização, o estado da vítima e a natureza do ferimento. A agilidade nesse acionamento é crucial para garantir que a pessoa ferida receba o tratamento adequado o mais rápido possível, aumentando as chances de recuperação e minimizando sequelas.

A Importância da Rapidez e da Eficiência no Atendimento

A ênfase no “socorro imediato” não é aleatória. Em situações de emergência médica, o tempo é um fator determinante entre a vida e a morte, entre a recuperação plena e a permanência de sequelas graves. A demora no atendimento pode agravar significativamente o quadro da vítima, reduzindo as chances de sobrevivência e aumentando o risco de complicações. Portanto, a celeridade na prestação dos primeiros socorros e no acionamento das equipes médicas é essencial para garantir a efetividade da assistência prestada.

Implicações da Omissão de Socorro

O decreto é claro ao estabelecer que a omissão de socorro é considerada uma falta grave, passível de responsabilização nas esferas administrativa, civil e criminal. Isso significa que os agentes que se omitirem ou retardarem indevidamente o socorro a uma pessoa ferida em decorrência de ação policial poderão ser punidos por sua conduta.

  • Responsabilidade Administrativa: A omissão de socorro pode resultar em sanções disciplinares, como advertência, suspensão ou até mesmo a exclusão da corporação, dependendo da gravidade do caso e das normas internas da instituição.
  • Responsabilidade Civil: O Estado pode ser responsabilizado civilmente pelos danos causados à vítima em decorrência da omissão de socorro, sendo obrigado a indenizá-la por danos morais e materiais.
  • Responsabilidade Criminal: A depender das circunstâncias, a omissão de socorro pode configurar crime previsto no Código Penal Brasileiro, como o crime de omissão de socorro (art. 135), lesão corporal (art. 129) ou até mesmo homicídio (art. 121), caso a omissão resulte na morte da vítima. A tipificação criminal dependerá da análise do caso concreto e da comprovação do nexo causal entre a omissão e o resultado danoso.

O Socorro Imediato como um Pilar da Atuação Policial Humanizada

A obrigatoriedade do socorro imediato, prevista no Decreto nº 11.984/2024, é um elemento fundamental para a construção de uma atuação policial mais humanizada e alinhada aos princípios dos direitos humanos. Ela reforça a ideia de que a preservação da vida e da integridade física deve ser sempre a prioridade máxima das forças de segurança, mesmo em situações de confronto.

Ao garantir a assistência médica necessária às pessoas feridas em decorrência de ações policiais, o Estado reafirma seu compromisso com a dignidade humana e com a construção de uma sociedade mais justa e segura para todos. A efetividade dessa diretriz, no entanto, depende do comprometimento das instituições policiais em capacitar seus agentes, implementar protocolos claros e fiscalizar rigorosamente o cumprimento da lei. A sociedade, por sua vez, deve permanecer vigilante e cobrar das autoridades o respeito a esse direito fundamental.

6. Comunicação Obrigatória:

Qualquer uso da força que resulte em morte ou ferimento grave deve ser imediatamente comunicado à autoridade competente. Essa comunicação deve ser feita de forma detalhada, incluindo informações sobre as circunstâncias da ocorrência, os agentes envolvidos e as medidas adotadas. Essa medida visa garantir maior transparência e controle sobre as ações policiais.

7. Formação e Capacitação Continuada:

O decreto prevê a implementação de programas de formação e capacitação continuada para os agentes de segurança pública, com foco nos princípios e diretrizes estabelecidos pelo documento. Esses programas devem abordar temas como direitos humanos, técnicas de abordagem, uso diferenciado da força, mediação de conflitos e atendimento a grupos vulneráveis. A ideia é que os agentes estejam preparados para lidar com as mais diversas situações de forma profissional, eficaz e respeitando os direitos fundamentais.

Implicações e Desafios para o Rio de Janeiro

O estado do Rio de Janeiro, marcado por altos índices de violência e por uma longa história de operações policiais controversas, será profundamente impactado por essas novas diretrizes. A implementação do Decreto nº 11.984/2024 exigirá uma mudança de cultura nas instituições policiais fluminenses, com ênfase na formação continuada dos agentes, na adoção de protocolos claros e na fiscalização rigorosa do cumprimento das normas.

Desafios na Implementação:

  • Resistência Interna: É possível que haja resistência por parte de alguns setores das corporações policiais, que podem encarar as novas regras como um entrave ao seu trabalho.
  • Falta de Recursos: A implementação efetiva do decreto exigirá investimentos em equipamentos de menor potencial ofensivo, tecnologia e, principalmente, em capacitação. A escassez de recursos pode ser um obstáculo significativo.
  • Complexidade Operacional: A aplicação prática dos princípios da necessidade, proporcionalidade e conveniência em situações de confronto pode ser extremamente complexa e desafiadora para os agentes na linha de frente.
  • Necessidade de mudança na cultura da segurança pública: Há a necessidade de uma mudança cultural profunda, que valorize a preservação da vida e os direitos humanos como princípios fundamentais da atuação policial.

Perspectivas Futuras e o Papel do “Portal RJ News”

O Decreto nº 11.984, de 11 de abril de 2024, representa um avanço importante na busca por uma segurança pública mais eficiente e respeitadora dos direitos humanos no Brasil. No entanto, sua efetividade dependerá de uma série de fatores, como a vontade política dos governantes, o engajamento das instituições policiais, a disponibilidade de recursos e o monitoramento constante por parte da sociedade civil.

O “Portal RJ News” se compromete a acompanhar de perto a implementação dessas novas diretrizes, investigando, fiscalizando e cobrando das autoridades o cumprimento integral do decreto. Continuaremos a dar voz às vítimas de violência policial, a cobrar por justiça e a promover o debate público sobre segurança pública e direitos humanos. Acreditamos que a construção de uma sociedade mais justa e segura passa necessariamente pela qualificação do debate público e pelo exercício pleno da cidadania. O decreto é apenas o primeiro passo de uma longa jornada.

O “Portal RJ News” estará presente em cada etapa, cumprindo seu papel de informar, fiscalizar e contribuir para a construção de um Rio de Janeiro e um Brasil mais justos e seguros para todos. A verdadeira mudança só será possível com a participação ativa de toda a sociedade e com a cobrança constante por uma atuação policial pautada pela ética, pela legalidade e pelo respeito inegociável à vida e à dignidade humana.

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